Justiça
Publicado em 05/02/2025 - 10h24min
STJ rejeita tese de 'racismo reverso' em AL
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Foto: Reprodução
STJ rejeita tese de 'racismo reverso' em AL
Por unanimidade, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, nesta terça-feira (4), anular as decisões da Justiça de Alagoas — em primeira e segunda instâncias — que haviam acolhido uma denúncia do Ministério Público de Alagoas (MP/AL) por injúria racial. O caso envolvia um homem negro acusado de ofender um italiano branco com referências à cor de sua pele.

Os ministros entenderam que a conduta se enquadra como injúria simples, e não injúria racial. Com essa decisão, o STJ reforça que o ordenamento jurídico brasileiro não reconhece a tese de “racismo reverso”.

O caso ocorreu em 6 de julho de 2023, em Coruripe, Litoral Sul de Alagoas, quando um homem negro fez uma declaração ao italiano, afirmando que sua “cabeça branca, europeia e escravagista” o impedia de enxergar além de si mesmo. 

A defesa do réu ficou a cargo do Instituto do Negro de Alagoas (Ineg). Preocupada com a propagação da tese de racismo reverso, a Defensoria Pública da União (DPU) elaborou uma nota técnica para refutar esse argumento no sistema judiciário brasileiro.

Veja detalhes do julgamento

O relator da Sexta Turma do STJ, ministro Og Fernandes, ressaltou que, embora a interpretação da norma seja clara, é essencial reforçar a argumentação para descartar qualquer tentativa de validar a tese de “racismo reverso”.

No entanto, ele ressaltou que, para configurar injúria racial, é necessário um elemento discriminatório, o que não se verificou no caso em questão. Ainda assim, o ministro afirmou que a ofensa poderia ser analisada no contexto da injúria simples. 

Fernandes enfatizou que a injúria racial não pode ser aplicada a casos em que a ofensa tem como foco a cor da pele de uma pessoa branca. Segundo o ministro, isso não significa que indivíduos brancos não possam ser ofendidos por pessoas negras, pois “a honra de todas as pessoas é protegida pela lei, inclusive pela injúria simples”. 

A injúria simples ocorre quando alguém atinge a dignidade ou o decoro de outra pessoa, conforme previsto na legislação, com pena de detenção de um a seis meses. Já a injúria racial se caracteriza quando a ofensa é motivada por raça, cor, etnia ou origem nacional, punida com reclusão de dois a cinco anos.

Decisão tem significado histórico 

O advogado do Ineg, Pedro Gomes, disse que desde o início havia confiança de que, ao chegar ao STJ, o debate seria conduzido de forma mais qualificada e embasada. “Sabíamos que o caso seria tratado com a devida importância e gravidade, o que aumentaria a repercussão e a possibilidade de uma decisão favorável para nós”, afirma.

Gomes destaca que, embora já esperassem esse desfecho, a confirmação da decisão trouxe grande satisfação. “Estamos muito felizes com esse desfecho. Na verdade, já esperávamos essa decisão, mas, mesmo assim, é uma grande satisfação vê-la confirmada”, disse.

O advogado elogiou o voto do ministro Og Fernandes, ressaltando que ele conseguiu compreender e expressar com precisão os argumentos apresentados pelo Ineg. “Foi de extrema importância — não apenas para a população negra de Alagoas, mas para toda a população negra brasileira”, ressalta. 

Para ele, a decisão do STJ reforça que o conceito de “racismo reverso” não tem respaldo jurídico. “Já sabíamos que a tese do chamado 'racismo reverso' não se sustentava socialmente, e o ministro reforçou que essa ideia também não tem respaldo no ordenamento jurídico brasileiro”, explicou. Ele acrescentou que o entendimento do STJ está em consonância com outras decisões judiciais recentes no país.

Gomes também pontua que Alagoas estava em desacordo com a jurisprudência nacional ao levar adiante um caso como esse. “Infelizmente, Alagoas estava na contramão do restante do país nesse aspecto, mas essa decisão demonstra o compromisso do STJ, conhecido como o tribunal da cidadania, em garantir um julgamento justo e alinhado aos princípios legais.”

Para o Ineg, a decisão tem um significado histórico. “Trata-se de um marco jurídico para o país, e termos levado esse debate adiante, contribuindo para uma mudança significativa, nos enche de orgulho”, declara. Gomes ainda enfatiza a importância do trabalho da advocacia local nesse processo: “Alagoas está de parabéns — não apenas o Ineg, mas toda a advocacia alagoana, que teve um papel fundamental nesse avanço”.

Relembre o caso 

Em setembro de 2023, um italiano entrou na Justiça com uma queixa-crime contra um homem negro de Coruripe, no Litoral Sul de Alagoas. A acusação teve origem em uma conversa pelo WhatsApp no dia 6 de julho, quando o réu afirmou ao estrangeiro que sua “cabeça branca, europeia e escravagista não deixava enxergar nada além dele mesmo”.

O caso foi encaminhado ao Ministério Público após a sanção da Lei nº 14.532/2023, que passou a equiparar a injúria racial ao crime de racismo. Com essa mudança, a ação penal tornou-se pública, permitindo que apenas o MP apresentasse denúncia contra o suspeito.

Em janeiro de 2024, a promotora Hylza Paiva Torres de Castro denunciou o homem negro por injúria racial, e o juiz da 1º Vara de Justiça de Coruripe, Mauro Baldini, aceitou a acusação. Meses depois, em maio, a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL) rejeitou um recurso do Ineg, que buscava arquivar o processo, mantendo o réu no caso. Diante dessa decisão, a defesa recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

(Assessoria)
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